Menos de 5% das startups brasileiras foram fundadas somente por mulheres
Artigo atualizado em 8 de março de 2021
Há anos o Distrito tem mapeado o ecossistema de inovação no país e, a cada estudo, um fato preocupante constantemente é evidenciado: a desigualdade de gênero entre os fundadores das startups brasileiras é uma realidade. O estudo inédito Female Founders Report 2021, produzido pelo Distrito Dataminer, em parceria com a B2Mamy e Endeavor, foi idealizado com o intuito de trazer uma visão pautada em dados sobre o quanto o ecossistema de inovação é diverso e inclusivo.
Apesar do crescimento do ecossistema de startups e venture capital no Brasil, com recordes alcançados nos últimos anos, apenas 4,7% das startups brasileiras foram fundadas exclusivamente por mulheres e 5,1% por mulheres e homens. Ou seja, podemos concluir, portanto, que mais de 90% desses negócios possuem somente homens em seus quadros de fundação.
Atualmente, o ecossistema brasileiro de startups possui cerca de 13 mil startups, de acordo com o Distrito Dataminer. O estudo considerou uma amostra de, aproximadamente, 6.200 startups que apresentaram dados e informações consistentes para que todas as análises propostas fossem realizadas. Além da pesquisa quantitativa, foi elaborada também uma pesquisa qualitativa com mais de 400 mulheres empreendedoras. A pesquisa tem 96% de nível de confiança, com 4% de margem de erro.
Estudo Female Founders foi destaque no Fantástico
No domingo (28), o estudo Female Founders Report 2021 foi tema de reportagem exclusiva do Fantástico, e a Lilian Natal, head do programa Distrito For Startups, foi convidada para dar uma entrevista e falar mais dos dados levantados por nosso time. Confira a reportagem na íntegra.
Em 10 anos, a desigualdade de gênero entre fundadores de startups mudou pouco
Há dez anos, quando o ecossistema de startups brasileiro ainda estava no seu estágio inicial de desenvolvimento — tinha 18% do tamanho que tem hoje –, as empresas de base tecnológica fundadas apenas por mulheres representavam 4,4% deste mercado e outras 3,5% tinham fundadores de ambos os gêneros. Aquelas fundadas exclusivamente por homem eram 92,1% em 2011. Em 2020, são 90,2%. Quando os quadros societários são analisados, a presença feminina é um pouco maior: 29,5% das startups brasileiras possuem mulheres entre os sócios.
“Os números aos quais chegamos comprovam uma disparidade de gênero imensa e que já era percebida pelo ecossistema de empreendedorismo. Proporcionalmente, o número de startups fundadas por homens é 20 vezes superior ao daquelas criadas por mulheres”, aponta Lilian Natal, líder do Distrito for Startups. “Este levantamento traz uma fotografia atual da presença das mulheres neste universo e, com elas, compreendemos quais as reais dificuldades que enfrentam no dia a dia. Reconhecer o problema e entender a sua real grandeza é um primeiro passo para projetarmos uma economia mais igualitária, sustentável, equilibrada e justa”, completa.
“O modelo de impacto da Endeavor se baseia na figura do exemplo. Mas, como apontado pelo estudo, temos uma baixíssima representatividade de mulheres no ecossistema de inovação. Por isso, desde 2020, assumimos o compromisso de estimular o comprometimento das scale-ups com a construção de um ecossistema mais diverso e inclusivo”, explica Renata Mendes, diretora de Relações Institucionais e Advocacy da Endeavor, referindo-se às startups mais maduras. “O Female Founders nos mostrou que a falta de diversidade é ainda mais gritante entre scale-ups, grupo que representa apenas 4% das empresas do ecossistema”, completa.
Investimentos desiguais
O Female Founders Report 2021 analisou também qual é o cenário atual de investimentos em relação ao empreendedorismo feminino. E mais uma vez, os dados demonstram uma grande disparidade entre gêneros: as startups lideradas só por mulheres receberam apenas 0,04% dos mais de US$ 3,5 bilhões aportados no mercado em 2020.
Além disso, de acordo com o estudo, quase 65% das empresas com mulheres à frente surgiram só nos últimos cinco anos, e mais de 50% delas ainda estão em fase de validação de produto ou início de operações. Isso explica, por exemplo, por que 60% das empreendedoras ouvidas apontam que escalar o negócio é o principal desafio enfrentado em suas jornadas.
A validação do modelo de negócio (56,4%), a falta de boas conexões (44,6%) com investidores, mentores e outros empreendedores e a dificuldade em captar investimentos (38,8%) também são questões bastante apontadas pelas entrevistadas.
Nesse contexto, o relatório mostra a importância de aumentar a presença feminina no mercado de venture capital, como forma de reduzir essa assimetria. Hoje, 74% dos fundos não têm mulheres entre seus fundadores, nem mesmo conselhos. E apenas 3% têm exclusivamente mulheres entre as fundadoras.
Questionadas durante a pesquisa acerca da tentativa de captação, 68,2% das mulheres entrevistadas responderam que não fizeram este movimento. As demais, não precisaram captar por terem ainda recursos próprios ou por não saberem exatamente o caminho das pedras para isto. Entre as que foram ao mercado em busca de recursos, 36,2% não conseguiram.
Assédio Moral
No grupo entrevistado, 72,4% das mulheres que passaram por dinâmicas de captação afirmaram ter sofrido assédio moral em função do gênero durante suas entrevistas. Muitas foram questionadas se eram ou se pretendiam ser mães, qual era a idade de seus filhos na ocasião, se possuíam homens no quadro societário e, ainda, se seriam capazes de tocar o negócio por conta própria.
“Sem pontes, capital e habilidades necessárias para navegar nesse universo, as mulheres não se sentem representadas e suas jornadas são árduas”, comenta Dani Junco, CEO da B2Mamy. “Há 5 anos, temos desenvolvido o ecossistema, acelerando estas fundadoras no início de suas startups, período reconhecidamente mais desafiador para elas. Adaptamos a narrativa, envolvemos elas com a comunidade e oferecemos conteúdos que possam ajudá-las nesta empreitada. Dessa forma, elas não precisem mais optar entre carreira ou vida pessoal.”
Moda é o setor com maior presença feminina
Ao analisar os setores, o Female Founders Report 2021 mostra que as mulheres têm uma presença consideravelmente maior nas fashiontechs. Mais de 60% das empresas inovadoras neste ramo foram fundadas por mulheres. Na sequência vêm as áreas de RH & Gestão de Pessoas (26,7%), Negócios Sociais (24,1%) e Alimentação (22,7%). Juntos, no entanto, esses setores representam apenas 3,5% do ecossistema de startups no Brasil. Entre os setores mais díspares, temos as startups que atuam nas áreas Jurídica (6,7%), Gestão & TI (5,1%) e Indústria 4.0 (4,8%).
Olhando para as empreendedoras, vê-se que elas estão mais concentradas em startups voltadas para a Saúde (15,5%), seguido por Educação (12,7%) e Serviços Financeiros (8,2%). Isso mostra que o fato de elas serem maioria em determinado setor, como as fashiontechs, não significa uma preferência geral das mulheres pela área.
O estudo também evidencia a pouca diversidade entre as mulheres que lideram startups: 76,5% delas são brancas, e 87,5% se declaram heterossexuais. Quase metade afirma não ter filhos.
O Female Founders Report 2021 ainda traz entrevistas com empreendedoras de destaque e dados sobre a presença de mulheres no ecossistema global de inovação. Além disso, você tem acesso a depoimentos, feitos de forma anônima, sobre os desafios enfrentados por elas em um mercado predominantemente masculino.