Agtechs: entenda o panorama das startups latino-americanas do agronegócio
Artigo atualizado em 19 de dezembro de 2023
O agronegócio move a economia latino-americana, representando mais de 25% do PIB brasileiro e mais de 10% em outros países da região. Mas com grandes poderes vêm grandes responsabilidades e, por isso, o setor tem sido cada vez mais cobrado para produzir de maneira sustentável e responsável com as próximas gerações. É aí que reside a missão das agtechs, startups que atuam no agronegócio e que tem revolucionado a produção agropecuária
As agtechs são um dos players responsáveis por movimentar o setor e ditar novas tendências tecnológicas.
Panorama de agtechs na América Latina
Segundo o AgTech Report 2023, são 769 agtechs que atuam em solo latino-americano, estando 76,5% no Brasil.
Grande parte delas (74%) oferecem soluções B2B, ou seja, soluções voltadas para empresas que atuam no campo.
Quando olhamos para o Brasil, essa participação é ainda mais expressiva: atualmente 81% das agtechs fornecem soluções para um público B2B.
Outro fato que distingue o AgTech dos outros setores é a sua distribuição geográfica: diferente dos outros setores, a concentração de startups nas grandes metrópoles é menor no agro.
Startups do mundo todo costumam se concentrar onde tem mais recursos financeiros e tecnologias disponíveis. Porém, no agronegócio essa dinâmica é diferente, de forma que as agtechs se instalam mais perto do seu público consumidor, ou seja, no campo.
Entre as soluções mapeadas, a categoria “agricultura de precisão” é a mais representativa, com 17,7% do total. Além disso, destacam-se a oferta de software de gestão da produção agropecuária e o uso de internet das coisas e big data analytics para o campo. Entre as demais soluções tecnológicas para a agropecuária, temos um cenário bastante equilibrado entre biotecnologias, automação e robotização e soluções de marketplace.
Por último, a maioria das agtechs (48,3%) estão focadas em oferecer soluções para a produção agropecuária, demonstrando sua grande preocupação em oferecer soluções que otimizem as rotinas produtivas.
Investimento em agtechs cresceu nos últimos anos
Tais características contribuíram para que as agtechs ganhassem cada vez mais relevância no ecossistema latino-americano de inovação.
Isso também refletiu nos investimentos recebidos. Ao todo, as agtechs captaram mais de US$ 650 milhões desde 2017.
É importante ressaltar que quase 70% desse valor foi aportado de 2021 até agora.
Além disso, diferente do mercado, que sofreu uma queda expressiva no volume de investimentos em 2022, o setor AgTech registrou um recorde de captação no último ano, conforme o gráfico abaixo.
Ademais, a maior parte das rodadas de investimento, está concentrada no estágio Seed. Isso demonstra que o setor AgTech ainda está em fase de amadurecimento.
Por fim, nos últimos anos, houve também dezessete aquisições em agtechs, com participação tanto de empresas do agronegócio, como também de outros setores, como no caso da compra da Gira, que oferece tecnologia financeira para o agronegócio, pelo banco Santander em 2020.
Principais desafios do setor AgTech
Apesar das agtechs estarem aumentando sua participação dentro do campo, nem tudo são flores, muito pelo contrário: há inúmeras barreiras que fazem com que essas startups tenham mais dificuldades de oferecer soluções extremamente completas e robustas.
Para começar, há um grande problema de conectividade no campo. Hoje, 73% das propriedades rurais estão desconectadas da internet, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
Assim, é mais difícil oferecer soluções tecnológicas que dependem da internet para serem executadas.
Outro grande desafio enfrentado pelas agtechs reside no fator cultural.
Embora a tecnologia não seja novidade no agronegócio — na verdade é bem longe disso: segundo a Embrapa a tecnologia foi responsável por 59% do crescimento do agro no Brasil entre a década de 1970 e 2022 —, ainda há muita resistência por parte dos produtores rurais na adoção de novas tecnologias como dispositivos IoT, drones e inteligência artificial.
Mesmo com esses desafios, as agtechs seguem revolucionando o setor.
Tecnologias que estão impulsionando o setor
Do campo aberto ao digital, a tecnologia no agronegócio vem evoluindo rapidamente.
Se antes, na Agricultura 1.0, falávamos sobre roçadas manuais e trabalhos braçais, agora são a Agricultura 4.0 (com dispositivos IoT e imagens de satélite) e a Agricultura 5.0 (com inteligência artificial e modelos estatísticos) a bola da vez.
Tais evoluções refletem o papel importantíssimo que as tecnologias emergentes têm desempenhado para o avanço do setor AgTech. Conheça algumas delas!
Agfintechs para concessão de crédito financeiro
Financiar o agronegócio não é para qualquer um. Isso porque este é um setor que exige muitos recursos e está sujeito a fatores que não controlamos, como fenômenos climáticos.
Por isso, o processo de concessão de crédito pode ser muito moroso.
É aí que entram as agfintechs, agtechs que fornecem soluções financeiras exclusivamente para o setor.
As agfintechs se aproveitam das lacunas deixadas pelos bancos tradicionais para suprir demandas que tais instituições não conseguem suprir.
Um dos exemplos mais claros da atuação dessas empresas está na concessão de crédito. Para se ter uma ideia, os bancos tradicionais podem demorar até 4 meses para conceder crédito rural, processo esse que pode levar até 48 horas em algumas agfintechs.
Dessa forma, esse tipo de startup tem o potencial de democratizar o acesso a serviços financeiros para produtores rurais, oferecendo produtos e serviços mais personalizados e eficientes em um período muito menor de tempo.
Internet das Coisas (IoT) para otimizar a produção
A Internet das Coisas (IoT) está tornando o agronegócio em um mercado mais produtivo, sustentável e rentável.
A partir da IoT, os produtores podem coletar e analisar dados em tempo real sobre suas operações, o que pode ajudá-los a tomar decisões mais informadas sobre como melhorar a produtividade.
A fim de ilustração, os produtores podem usar dados de sensores para identificar áreas de baixa produtividade e tomar medidas para melhorar a fertilidade do solo ou a irrigação.
Do mesmo modo, podem coletar dados dos animais para identificar uma possível doença entre a criação e tomar medidas preventivas.
Esses dispositivos também são grandes aliados na redução de custos ao monitorar a utilização de recursos, como água e fertilizantes, e ajudar a evitar desperdícios, tendo consequência a redução do impacto ambiental.
Por fim, a IoT também pode automatizar tarefas, como pulverização e colheita, o que pode liberar tempo e recursos para os produtores.
Drones para eficiência operacional
Os drones, também conhecidos como VANTs (Veículos Aéreos Não Tripulados), são uma tecnologia que vem ganhando cada vez mais espaço no agronegócio.
Esses equipamentos não só fazem o monitoramento e mapeamento de grandes áreas, como também proporcionam uma maior eficiência operacional ao, a partir da aplicação de insumos, minimizar o uso de fertilizantes e agrotóxicos, detectar pragas, doenças e falhas no plantio, com base nas imagens capturadas, e até mesmo identificar focos de incêndio.
Eles também são responsáveis por fazer contagem do rebanho e localizar animais perdidos.
E não menos importante: os drones conseguem captar informações sobre a saúde da lavoura, ajudando na tomada de decisões mais assertivas.
Inteligência artificial para análise precisa de dados
E claro, não poderíamos terminar esse tópico sem falar de inteligência artificial (IA), tecnologia que tem conquistado o mercado cada dia mais.
A IA tem diferentes aplicações no campo, que vão desde a genotipagem para cultivo até equipamentos agrícolas automatizados.
É através da IA que grandes volumes de dados são analisados, gerando insights valiosos. Além disso, ela também é responsável por automatizar tarefas rotineiras no campo.
Assim, a IA apoia os produtores em uma tomada de decisão baseada em dados, o que poupa não só recursos financeiros, como também acelera a produtividade de forma mais sustentável.
Por que ainda não temos um unicórnio do agronegócio na América Latina?
Como vimos, o agronegócio é um dos setores mais importantes da economia da América Latina. O Brasil, por exemplo, é o segundo maior produtor de alimentos do mundo. Mas, apesar de todo esse potencial, a região ainda não tem um unicórnio no setor AgTech.
O que falta pra isso acontecer?
Existem alguns fatores que precisam ser superados, como a falta de conectividade e a baixa adesão cultural da tecnologia.
Além disso, as corporações concentram grande parte da tecnologia, já que o setor agrícola é marcado por alguns riscos, como as safras, que demoram anos para serem colhidas. Isso favorece empresas já consolidadas, que têm capacidade financeira para investir em médio e longo prazo.
Porém, ainda há esperança para o setor AgTech.
Nos últimos anos, como vimos, o número de investidores em agtechs na América Latina está aumentando. Isso pode levar ao surgimento de mais startups com potencial para alcançar o status de unicórnio no futuro.
Além disso, algumas startups estão ganhando cada vez mais espaço no agronegócio, trazendo boas perspectivas para o futuro.
Enquanto isso, o agronegócio da América Latina precisa se reinventar para enfrentar os desafios modernos, como as mudanças climáticas e novos padrões de consumo. Essa transformação pode ser o impulso necessário para o surgimento do tão esperado unicórnio agropecuário.