Ampliar o acesso das MPEs ao crédito é determinante para a economia brasileira
Artigo atualizado em 26 de junho de 2020
Texto de Dorival Dourado, Head de Inovação do Grupo Omni
O crédito, importante alavanca de desenvolvimento, viabiliza as atividades operacionais (produção e comercial) e as estratégias de crescimento, equacionando os investimentos das empresas. Vem daí, a importância do pleno acesso aos mercados financiadores e às diferentes modalidades de crédito, fonte de recurso imprescindível à constante evolução e inovação. No entanto, essa acessibilidade nunca ocorreu para boa parte das micro e pequenas empresas (MPEs) do Brasil. A situação se agravou de forma contundente desde o início da pandemia.
De acordo com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), essas empresas são 98% das existentes no país, geram 57% dos empregos e contribuem com 20% do PIB (Produto Interno Bruto). São números que expressam a importância das MPEs para o desenvolvimento econômico do Brasil.
Na comparação internacional, em economias onde esses negócios são estruturados para a competitividade, eles chegam a representar 50% do PIB. Nessa direção, países como a Itália, Espanha, Japão, Taiwan, Coréia do Sul, Tailândia e China entre outros, são casos de sucesso.
Cenário brasileiro
No Brasil, nos últimos anos, grandes contribuições às MPEs têm sido adotadas, como a Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas, a criação da figura do Microempresário Individual, entre outras iniciativas que objetivam gradualmente formalizar esses empreendimentos. Com a crise no mercado de empregos formais, uma significativa parcela dessa população, empreendeu, estruturou, desenvolveu e formalizou seu pequeno negócio.
É importante reiteirar que para essas empresas formalizadas crescerem e serem viáveis há necessidade de crédito. Nesse tocante, há um fator crítico: essas empresas serem conhecidas pelos agentes financeiros. Ainda prevalece um sistema imperfeito de informações sobre elas, o qual abre espaço para a seleção adversa, quando não se distinguem bons de maus pagadores (chamado assimetria de informações).
Banco Mundial
O Banco Mundial mostra que vários países já passaram por esse fenômeno, que não é exclusivo do Brasil. É comum que as MPEs não possuam informações de crédito, não tenham histórico de suas transações financiadas e nem como elas foram pagas. Para quem concede crédito nessa situação fica difícil precificar o risco de uma determinada MPE, o que acaba gerando a necessidade de garantias crescentes para um financiamento ou mesmo a sua não aprovação.
Nesse contexto, é muito comum o empreendedor de micro e pequena empresa utilizar suas linhas de crédito ao consumidor para financiar seu negócio. Considerando que esse crédito é mais caro e tem prazos menores do que os de pessoa jurídica, tal prática leva a empresa a um grave desequilíbrio financeiro, pondo em risco sua sobrevivência.
O Banco Mundial, em seu relatório Improving SME financing through improved credit reporting (Melhorando o financiamento das MPEs por meio de relatórios aperfeiçoados de crédito), mostra que nos países emergentes onde não há informações abrangentes de crédito, de 55% a 68% dessas empresas não têm suas necessidades de crédito atendidas. Assim, para contornar essa assimetria de informações no mercado de crédito para MPEs, o organismo internacional destaca que são necessárias informações positivas, além das negativas, já presentes no mundo todo.
Como as MPEs operam no limite entre pessoa física e jurídica, em vários países a reputação do empresário no cadastro positivo é utilizada na análise de crédito de sua empresa, quando esta não possui informações suficientes. Em breve, quando o cadastro positivo estiver plenamente funcionando no Brasil, também contribuirá para uma melhor avaliação de crédito das micro e pequenos negócios. Como demonstra o Banco Mundial, um bom sistema de informações de crédito é condição fundamental para a evolução e sustentabilidade na oferta de recursos para qualquer empresa.
Caminhos possíveis
As MPEs têm como alternativa buscar crédito nos programas sociais. Mesmo assim, são poucas as que obtêm os recursos, devido à falta de informações básicas organizadas. Como recentemente apontou o maior banco de fomento do país, muitas vezes não há nem balancete de verificação. Este é outro ponto crítico das MPEs na procura por crédito, a carência de informações de desempenho econômico-financeiro.
Uma outra possível fonte de crédito para as MPEs são as cooperativas, que tem muita atratividade junto a esse segmento, por conta do atendimento personalizado, das taxas de juros menores, do melhor conhecimento da comunidade que atua e com ofertas personalizadas. Nos últimos anos, as cooperativas alcançaram crescimento expressivo, na ordem de 2.5 vezes maior que o sistema financeiro geral.
Considerando o atual momento, deveríamos analisar alternativas para encaminhar de forma estrutural o desafio de credito para as MPEs. Enquanto vemos ações contundentes nos Estados Unidos, onde não há exigência de garantias, 100% do risco é assumido pelo Tesouro e as dívidas são perdoadas se comprovada a manutenção dos empregos; e no Reino Unido onde o governo paga até 80% do salário do empregado das empresas privadas limitado a 2,5mil libras por mês; vemos aqui no Brasil inúmeras empresas morrerem todos os dias inibindo a iniciativa de milhares de empreendedores de criarem seus negócios.
Como um dos países mais empreendedores no mundo, o Brasil não pode desperdiçar esta vantagem. Deve criar condições para que essas iniciativas se desenvolvam, inovem e sejam competitivas internacionalmente.
As MPEs precisam serem vistas como agentes promotores do crescimento econômico e, um instrumento de redução da desigualdade social. Estão presentes em todos os rincões do país, gerando emprego e renda. Ampliar a participação desses negócios no PIB passa, obrigatoriamente, pela expansão do acesso ao crédito de forma facilitada e simplificada, além de políticas e medidas governamentais de sustentação.