Por que as fusões e aquisições de startups estão crescendo no Brasil?
Artigo atualizado em 1 de outubro de 2021
Em 2020, o ecossistema de startups brasileiro bateu um recorde histórico no número de fusões e aquisições: ao todo, ocorreram 163 M&As nesse período, um crescimento de 2,5 vezes em relação a 2019 (gráfico). Com a pandemia, muitas startups perderam caixa e não conseguiram mais continuar com um ritmo de crescimento acelerado, o que levou inúmeras delas a ser incorporadas por empresas mais sólidas e que conseguiram resistir bem à crise.
Entre outros fatores que contribuíram com o crescimento dessas transações no Brasil, está o amadurecimento das soluções desenvolvidas pelas nossas startups, que passaram a atrair cada vez mais o olhar das grandes corporações nacionais. Hoje, essas organizações estão todas de olho no potencial de inovação das jovens empresas de tecnologia e em como elas podem transformar radicalmente os setores em que operam.
Em geral, as empresas sempre confiaram em suas próprias equipes para aperfeiçoar os seus produtos, serviços e processos, ou mesmo para desenvolver um novo sucesso de mercado. Por muito tempo, as organizações foram bem-sucedidas em fazer prosperar os seus negócios através desse modelo de inovação clássico, ou ‘fechado’. Atualmente, porém, em um cenário repleto de startups que quebram as barreiras de indústrias consolidadas há décadas e séculos, é imperioso que essas organizações incorporem soluções externas para se manter competitivas e se preparar para o futuro.
Óbvio que a prática de incluir outros players nos processos de inovação de uma empresa não é nova. Na verdade, especialistas apontam que as economias mais desenvolvidas estão atravessando a sua sétima onda de fusões e aquisições. As primeiras ocorreram com o objetivo de estabelecer monopólios e oligopólios, diversificar a carteira de produtos, expandir as operações para o exterior ou ainda criar holdings. Já esta de agora, que começa a chegar ao Brasil, faz parte de uma estratégia conhecida como inovação aberta, por meio da qual as companhias passam por todo um processo de transformação digital a fim de acompanhar as tendências do universo da tecnologia.
No Brasil, uma das empresas que encararam essa jornada de renovação digital através das M&As foi o Magazine Luiza, que já adquiriu nada menos do que dez startups. A ideia por trás dessas operações é construir um ecossistema de negócios digitais no estilo SupperApp, parecido com o que se vê em gigantes como Amazon e Alibaba. De acordo com o Banco BTG Pactual, que reiterou a compra da ação do Magalu logo após esta anunciar a aquisição da startup de marketing Juni, a varejista está ‘cada vez mais focada em complementar seu já vasto portfólio de serviços para compradores e vendedores’, classificando a empresa como ‘uma das vencedoras no e-commerce brasileiro’.
As startups vão às compras
Eis que, em 2021, pela primeira vez no mercado de inovação nacional, quem mais está adquirindo startups no Brasil não são as organizações tradicionais, mas sim as próprias startups. Das 113 fusões e aquisições de startups ocorridas no primeiro semestre deste ano, 61 tiveram outras startups como compradoras, uma tendência pouco observada em economias emergentes. Em um ano em que o volume de capital de risco aplicado em jovens empresas de tecnologia atingiu níveis recordes (gráfico), é de se esperar que as investidas reservem parte do dinheiro recebido para M&As.
Startups mais maduras acabam adquirindo negócios menores para melhorar a qualidade técnica do seu quadro de funcionários ou mesmo para oferecer serviços e produtos diferentes daqueles considerados típicos de sua categoria. Embora dispendiosa, a compra de uma startup é uma estratégia mais segura se comparada à criação de uma solução dentro de casa, uma vez que as adquiridas geralmente já alcançaram product market fit e têm espaço garantido no mercado. Além disso, as fusões e aquisições também podem ser o caminho mais curto para quem planeja levar a sua startup para outras regiões ou mesmo outros países. A propósito, foi essa a estratégia do iFood para consolidar presença em vários locais do Brasil nos últimos cinco anos.
Em termos de número de aquisições de startups, as grandes startups campeãs do Brasil são a VTEX e o Nubank, ambas tendo realizado quatro compras cada. Um caso interessante é o da Easynvest, que foi adquirida pelo Nubank em setembro de 2020 e, em janeiro, também comprou uma fintech, a Vérios. Aliás, embora pouco comuns, as startups adquiridas e compradoras já não são raras no país. Outro exemplo: no último mês de maio, a startup de crédito imobiliário Atta comprou 60% da consultoria de seguros Otimize. Três meses depois, no início de agosto, a imobiliária digital QuintoAndar anunciou a compra da Atta.
As startups do setor de finanças são as mais adquiridas do mercado nacional de tecnologia. Nos seis primeiros meses de 2021, vinte e duas delas foram compradas por grandes empresas ou outras startups. Em um país em que os serviços bancários ainda estão bastante concentrados nas mãos dos bancos tradicionais, faz sentido que outros players tentem dissipar esse monopólio através da aquisição de fintechs. Já o modelo de negócio mais visado para aquisição no Brasil é o B2B, ou Business to Business (gráfico). Isso porque as startups com soluções voltadas para empresas têm maior potencial de receita, o que atrai mais os investidores.
250 M&As em 2021
O ecossistema de inovação brasileiro atravessou intacto a crise econômica causada pela Covid-19. Na verdade, foi muito graças a essa crise, que forçou as empresas a digitalizar os seus serviços, que as startups receberam volumes recordes de capital de risco em 2020 e mais ainda agora, em 2021. Assim é que tanto as companhias tradicionais quanto as startups deverão continuar comprando para aumentar o número de soluções, se aproximar de novas tecnologias, conquistar novos mercados etc.
Na última edição de 2020, em seu relatório mensal de análises do venture capital, o Distrito projetou que haveria 250 fusões e aquisições de startups no Brasil em 2021. Até esse mês de agosto, já ocorreram 160, ou 64% do total previsto para dezembro. Historicamente, o segundo semestre costuma ter uma quantidade maior de M&As: em 2020, por exemplo, foram 50 no primeiro e 113 no segundo. O Distrito mantém a estimativa de 250 fusões e aquisições para este ano, número que, inclusive, pode até ser superado.